terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Te negarei três vezes

Ontem, enquanto eu vinha pra Porto Alegre, lembrei que tinha uma carteira de cigarro aberta dentro do carro. Parada ali naquele para-e-arranca, minha cabeça começou a me sacanear de novo. E eu ali, na abstinência, doida pra ceder. Peguei o cigarro e botei na boca. Acendi o isqueiro. Nada. Falhou. Interpretei como sinal. Não fumei.

Mais tarde, já em casa, continuava com a carteira de cigarro dentro da bolsa. Por mais que inventasse coisas pra fazer e tentar não pensar naquele pacotinho dentro da bolsa, continuei com o pensamento fixo nisso. Peguei um cigarro. Deixei rolando entre os dedos. Cheirei. A tentação ficou quase insuportável. Amassei e joguei no lixo. Peguei meu primeiro chiclete de nicotina.

Fui dormir cedo. Afinal, todos nós precisamos de boas horas de sono. Essa é a oportunidade perfeita pra repor e ter um soninho de beleza. No fim das contas, uma das coisas que mais em empolga em parar de fumar é saber que a minha pele vai ficar muito melhor (pelo menos é que mais me é visível nas pessoas que pararam de fumar). Quem disse que eu dormi? Rolei prum lado, rolei pro outro. Cochilei. Acordei com uma dor no peito. Levantei e fui ver TV. Parecia impossível ficar na cama. Fui de novo na bolsa e peguei outro cigarro. Fiquei avaliando toda a situação. Porque, afinal, eu ainda tinha esta carteira de cigarro? Será que eu vou deixar minha cabeça continuar me sacaneando desse jeito? Cheirei o cigarro de novo. Lembrei de todos os momentos em que eu estava naquela mesma situação: sozinha em casa tendo apenas o cigarro como companhia. Lembrei de como eu gostava disso. Daí lembrei da Dulce Helfer, fotógrafa talentosíssima, que, num dia em que eu estava de plantão no jornal, fumando no corredor, veio conversar comigo sobre uma figura ilustre que também fumava. Falou de todo o sofrimento no fim da vida do Mário Quintana, grande escritor que se tornou amigo de Dulce. Falou da respiração difícil, da solidão que nunca era abrandada num quarto pobre de hotel. "A solidão, no fim, se tornou muito maior com a proximidade da morte. No fim das contas, o cigarro não era companheiro, era a própria morte querendo companhia". Deixei o cigarro na mesa. Fui na bolsa e busquei os outros que restavam. Amassei e rasguei todos.

Depois de conseguir negar essas três vezes e acabar com a tentação da companhia silenciosa, fui dormir. E, desta vez, dormi mesmo.

2 comentários:

  1. Um amigo me enviou o teu blog. Eu parei há dois meses e 13 dias (contando dias e horas tipo drogada..heheh). É bom ler e saber que eu não sou a única que sofre (sofreu) desenfreadamente parando. Pq, realmente, não é só a raiva, ou a fissura, como todo mundo fala. É toda uma perda emocional gigantesca. Eu sempre digo que a impressão que eu tinha era de ter perdido uma parte de mim, ou ainda, o melhor amigo de muitos anos. Eu fumava perto de duas carteiras por dia e, só de cogitar a hipótese de diminuir, eu já ficava tensa. Melhor parar de vez então. As duas primeiras semanas são as piores mas para mim, do 4° ao 10° dia foi o período mais problemático, a ponto de chorar muito diariamente. Depois começa a diminuir toda aquela inquietação. Eu engordei uns 5gk, pq comia de tudo e tomei muita, mas muita cerveja no início (eu precisava compensar a minha tristeza..rs). Hoje o peso estabilizou e não passo mais o dia pensando em comer ou beber a todo instante. Eu sinto falta do cigarro, mas é um sentir falta "saudável", ou seja, tenho saudades, mas não passo mal por isso. Ainda tenho uma carteira de cigarros que fica do lado do meu pc e permanece intocável desde novembro. Eu prefiro pensar que estou dando uma pausa gigantesca entre um cigarro e outro. Aliás, acho que essa é a melhor dica: encarar como o adiamento do próximo cigarro. Fica menos assustador do que a ideia de parar. Boa sorte :)

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    1. Oi, Rafaella! Tão bom ouvir outras histórias de quem passa o mesmo que a gente! Sabe, de início achei que poderia ter aquela carteira por perto, mas vi que, mais um pouco, teria fumado ela todinha!!! Não é nada fácil. É impossível substituir o vazio que o cigarro deixa. Mas a gente vai levando... rumo a uma vida mais saudável!! ;)
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      beijoca

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